Resposta ao editorial da Folha de S. que Paulo defende (com argumentação frágil) o projeto Future-se

29 de julho de 2019
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No dia 21 de julho, a Folha de S. Paulo publicou o editorial Debata-se, em apoio ao projeto Future-se, do Governo Federal.

O texto do jornal defende a entrega da gestão das universidades federais, alegando que “como demonstra à farta a experiência internacional, instituições de ensino superior que aspiram à excelência não devem depender exclusivamente de dinheiro público”, além de afirmar que a discussão deveria englobar também a cobrança de mensalidades de estudantes.

A publicação cria uma relação falaciosa entre investimento privado e qualidade. O posicionamento é no mínimo incoerente, já que a edição mais recente de um ranking elaborado pela própria Folha mostra que 43 das 50 instituições melhores colocadas são públicas, e que não há nenhuma faculdade privada entre as dez melhores instituições de ensino superior do país.

Inúmeras outras listagens do gênero, elaboradas por diversas organizações de vários países, apontam universidades brasileiras entre as melhores do mundo – incluindo a UFPR, que apareceu recentemente entre as mil melhores instituições do planeta na lista da QS World University Rankings (é também a 7ª no RUF). Em todos esses rankings, o número de faculdades particulares brasileiras é ínfimo.

Esses resultados contrariam também a argumentação da Folha de que as universidades públicas enfrentam uma “má gestão”, que poderia ser consertada com a chegada das Organizações Sociais (OS).

A história recente já comprovou a ineficiência da gestão de OS em diversos setores. Basta ver o imenso caos da saúde pública do Rio de Janeiro, onde organizações desse tipo estão envolvidas em inúmeros escândalos de corrupção e desvio de recursos, e sua ineficiência na gestão de hospitais públicos é responsável pela ampliação da situação calamitosa no estado.

O editorial ignora também os dados da própria Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que aponta que 99% das pesquisas científicas do país são produzidas por universidades públicas. É o trabalho desses pesquisadores que se traduz em mudanças reais para a sociedade, impactando áreas como saúde, segurança pública, agricultura, saneamento, transporte, urbanismo, cultura, habitação, energia e novas tecnologias, apenas para citar algumas.

Nada disso seria possível com o aumento progressivo da participação de empresas privadas no financiamento do ensino público, já que a prioridade passaria a ser sempre de projetos que trouxessem lucro imediato e retorno para o investimento realizado, ignorando totalmente o impacto social dos trabalhos desenvolvidos pelo tripé de ensino, pesquisa e extensão.

O exemplo (péssimo, mas revelador) dado pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, em entrevista ao portal UOL (do grupo Folha) já indica o tenebroso papel que o governo quer conferir à relação entre universidades federais e a iniciativa privada, e qual a real intenção por trás do projeto: “Empresas internacionais querem explorar a biodiversidade da Amazônia cientificamente, ou mesmo empresas nacionais”.

As universidades federais perderiam sua função social. A população brasileira será a principal prejudicada caso o Future-se saia do papel. Diferentemente de outros países considerados “mais desenvolvidos”, grande parte dos problemas sociais no Brasil dependem de soluções gestadas dentro das universidades públicas.

A tal experiência “de sucesso” de outros países com a privatização é, também, questionável. De acordo com uma pesquisa da Universidade de Sussex, na Inglaterra, os principais estudantes afetados pelo avanço da privatização de universidades no Reino Unido foram os filhos dos trabalhadores – o que inclui a classe média – afugentados pela falta de apoio financeiro para manter seus estudos e pela progressiva cobrança de taxas, proposta que anda junto com a entrega administração das instituições à iniciativa privada.

Há uma tentativa generalizada de tentar convencer o povo brasileiro de que há algo de bom no desmonte do ensino público e que a segregação entre ricos e pobres dentro das universidades públicas seria salutar. A verdade é que a conta será alta para quem não integra as camadas mais favorecidas da sociedade, e será cobrada em um futuro próximo.

A população que investe na universidade pública e obtém dela retornos inestimáveis, vai pagar – novamente – o preço do Future-se. Mas dessa vez, quem irá receber algo em trocar serão as empresas privadas. Por questão de coerência, o projeto deveria levar outro nome: Fature-se.

Fonte: APUFPR


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