Licença-paternidade: a necessária adequação aos tempos modernos


As licenças maternidade e paternidade são consideradas garantias básicas dos trabalhadores, conforme previsão constitucional, por serem indispensáveis à boa formação e desenvolvimento do recém-nascido. Diversos estudos demonstram a importância e benefícios, para a sociedade como um todo, da adequação temporal dessas licenças.
São avaliados desde aspectos econômicos, que englobam os gastos com saúde pública – pois, segundo os dados da Sociedade Brasileira de Pediatria, bebês que são amamentados por mais de seis meses e ficam mais tempo ao lado dos pais têm reduzidas as chances de contrair doenças –, até aspectos sociais, que mostram que a criminalidade está associada à carência afetiva nos primeiros anos de vida.
Além disso, o nascimento da criança é um período de adaptação para toda a família, em que a mãe está psicologicamente vulnerável em razão das alterações hormonais e da nova realidade, muitas vezes exaustiva, precisando do apoio do companheiro não só emocionalmente, mas também nas tarefas domésticas e de cuidados com o bebê.
A Consolidação das Leis do Trabalho, desde a sua entrada em vigor no ano de 1943, prevê a concessão de licença-maternidade. A legislação sofreu alterações desde então, prevalecendo, hoje, a licença-maternidade de 120 dias. Já a licença-paternidade é de cinco dias, conforme disposto no artigo 10, §1.º, do Ato de Disposições Constitucionais Transitórias, que, neste caso, prevalece sobre a CLT, que só prevê um dia de folga ao pai.
Algumas leis esparsas preveem a concessão de licença-maternidade de 180 dias aos trabalhadores do serviço público, por exemplo, bem como para aquelas mães empregadas das empresas participantes do programa Empresa Cidadã. Há, ainda, projeto de lei de autoria da senadora Rose de Freitas (MDB/ES), já aprovado no Senado Federal e em tramitação na Câmara, que prevê a alteração da CLT, ampliando a licença-maternidade para 180 dias para todas as trabalhadoras.
Percebe-se uma intensa movimentação e preocupação da sociedade em aumentar e regulamentar o período da licença-maternidade. No entanto, em que pese a existência de diversos projetos de lei e propostas de emendas constitucionais em trâmite no Senado e na Câmara, a licença-paternidade no Brasil foi minimamente alterada.
A discussão acerca de tal disparidade entre as licenças e da desigualdade de gêneros é um debate antigo e polêmico. A criação dos filhos não é mais exclusividade das mães. Essa já não é a realidade da sociedade brasileira, de tal modo que a legislação merece uma readequação. Trata-se de típica normatização arcaica e discriminatória em relação à estrutura familiar, que, ao tentar proteger a mulher, concedendo-lhe a licença estendida, menospreza a importância paternal e incentiva a desigualdade de gênero no mercado de trabalho. Afinal, a lei fomenta a contratação de homens em detrimento de mulheres potencialmente férteis.
É dissonante a previsão normativa a respeito da licença-paternidade daquelas contidas na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na Consolidação das Leis do Trabalho. A Constituição prevê, no artigo 5.°, inciso I, que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”, aprofundando o tema no artigo 226, §5.º, que dispõe que os direitos e deveres, na sociedade conjugal, devem ser exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. No mesmo sentido são as disposições dos artigos 227 e 229, que tratam sobre o dever dos pais nos cuidados dos filhos. As previsões contidas do ECA também pretendem garantir ao menor a criação, sustento e educação pela família, devendo o poder familiar ser exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, que deverão compartilhar as responsabilidades e deveres. Já a CLT tem um capítulo destinado à proteção do trabalho da mulher, com disposições legais que pretendem evitar a discriminação por sexo, evitando-se, assim, maiores desigualdades no ambiente de trabalho. No entanto, tais disposições ainda não são suficientes para garantir a igualdade de gêneros e não garantem o exercício da paternidade responsável e a formação do vínculo afetivo.
Em alguns países europeus é possível identificar uma forte evolução no que diz respeito à equiparação. Na Suécia, por exemplo, os pais, conjuntamente, têm direito a até 480 dias de licença parental, sendo que ao pai é assegurada a permanência integral de 90 dias ao lado da criança. Na Islândia, a licença é de nove meses compartilhados.
O que se busca com a igualdade não é suprimir todas as diferenças, sejam elas naturais ou culturais, mas sim permitir que o exercício do poder familiar seja realizado por ambos os pais e reconhecer a importância da função paternal no ambiente doméstico, visando, ainda, a igualdade de gênero no acesso ao mercado de trabalho.

Carolina Tamega é especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.
Fonte: Gazeta do Povo

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