
Um pai que não acredita que dinossauros existiram, ou que acha que a Terra é plana porque assistiu a algum vídeo perturbador em suas redes sociais. Um filho que não vai para a escola porque sua família acredita que professores são seres perversos e doutrinadores que irão desvirtuar as crianças.
O que será desse estudante quando chegar à adolescência ou à idade adulta e descobrir a esfericidade do planeta e que não existe um complô mundial de museus renomados para criar uma história sobre animais gigantes que habitaram o planeta a centenas de milhões de anos?
Esses seriam alguns dos paradoxos criados caso o projeto de “ensino domiciliar”, conhecido como homeschooling, seja definitivamente aprovado no Brasil.
Um projeto folclórico, apresentado lá em 2012, voltou à baila no Congresso Nacional e recebeu aprovação da Câmara dos Deputados no dia 18 de maio com 264 votos de parlamentares que demonstraram que estão dispostos a qualquer coisa para conseguir votos de extremistas nas eleições de outubro deste ano.
A APUFPR manifesta publicamente seu completo repúdio a mais essa estratégia que, além de deslegitimar o papel da educação pública, é usado para desviar a atenção dos brasileiros dos problemas reais do país (para os quais o governo de Jair Bolsonaro não consegue apresentar solução). O sindicato espera que os senadores votem com mais seriedade.
Bandeira de oportunistas
Tirar o projeto de ensino domiciliar da gaveta foi apenas uma estratégia eleitoreira de Jair Bolsonaro, desesperado para manter o apoio de fiéis seguidores que precisam ser alimentados constantemente de teorias conspiratórias para continuar apoiando seu projeto de poder, que está levando o Brasil para abismo.
A justificativa de muitos parlamentares que foram favoráveis ao projeto transforma profissionais da educação em vilões, ignorando que o aprendizado escolar se dá para muito além do conteúdo transmitido nas salas de aula. É parte do esforço coletivo e social.
Mesmo que 80% seja contra, segundo pesquisa Datafolha, os deputados resolveram aprovar o projeto porque disputam entre si uma parcela cada vez menor de eleitores ligados a bolhas extremistas. Muitos desses mesmos parlamentares foram eleitos com discursos de ódio, na rabeira da campanha de Bolsonaro e, por isso, não possuem base real na sociedade. Grande parte não conseguirá se reeleger, ainda mais porque com a real possibilidade de derrota do presidente (no cenário que se projeta), o eleitorado radical está encolhendo.
Sem convívio
Apartando crianças e adolescentes do convívio escolar, o governo prejudicaria a formação desses alunos, privados da interação com outros colegas, com professores e com a comunidade escolar. Sem conviver com as diferenças ou com situações que não são moldadas apenas por suas vontades, esses estudantes teriam muito mais dificuldades em lidar com as contrariedades da vida adulta.
No caso de estudantes portadores de deficiência, a falta de convívio seria ainda mais cruel, comprometendo as possibilidades e os esforços de inclusão que há anos são feitos.
Ameaça à saúde e à segurança dos estudantes
Além dos inúmeros perigos no processo de ensino-aprendizagem e na formação humana dos estudantes, o projeto de homeschooling ainda coloca em risco a saúde e a segurança de crianças e adolescentes.
No Brasil, a escola é um importante espaço de atenção aos problemas psicológicos e de saúde mental, e também de fiscalização e combate ao trabalho infantil, à violência sexual, à insegurança alimentar e diversas outras formas de exploração ou vulnerabilidade social.
No caso das violências sexuais contra crianças e adolescentes, por exemplo, estudos indicam que cerca de 80% dos crimes ocorrem dentro de casa, e muitas vezes essas situações só são denunciadas e superadas graças à atenção dos profissionais de educação das escolas. Certamente, pedófilos e abusadores estão felizes com essa votação na Câmara.
As políticas públicas precisam caminhar para ampliar e qualificar o acesso universal à Educação, e este projeto, resgatado pelo governo Bolsonaro, caminha exatamente no sentido contrário.
Além disso, a convivência no ambiente escolar é fundamental para socialização, inclusão, proteção e formação de nossas crianças e adolescentes, e não pode ser prejudicada por medidas meramente eleitoreiras.
Como votaram?
O absurdo texto aprovado na Câmara recebeu 264 votos favoráveis, 144 contrários e duas abstenções. Os partidos de oposição PT, Psol, Rede, PV, PDT, PSB e PCdoB, que costumam defender a pauta da educação, orientaram suas bancadas a votar contra o projeto.
Já o centrão e os partidos de direita orientaram o voto a favor. O projeto vai agora ao Senado onde se espera que seja barrada (assim como já aconteceu em outros projetos absurdos que haviam sido aprovados na Câmara).
Votos dos paranaenses
Veja na lista abaixo como votou cada deputado federal paranaense.
Aliel Machado (PV-PR) – Contra
Aline Sleutjes (PROS-PR) – A favor
Aroldo Martins (Republican-PR) – A favor
Christiane Yared (PP-PR) – Contra
Diego Garcia (Republican-PR) – A favor
Enio Verri (PT-PR) – Contra
Felipe Francischini (União-PR) – A favor
Filipe Barros (PL-PR) – A favor
Giacobo (PL-PR) – A favor
Gleisi Hoffmann (PT-PR) – Não votou
Gustavo Fruet (PDT-PR) – Contra
Hermes Parcianello (MDB-PR) – A favor
Leandre (PSD-PR) – A favor
Luciano Ducci (PSB-PR) – Contra
Luisa Canziani (PSD-PR) – A favor
Luiz Nishimori (PSD-PR) – A favor
Luizão Goulart (Solidariedade-PR) – A favor
Ney Leprevost (União-PR) – A favor
Osmar Serraglio (PP-PR) – A favor
Paulo Martins (PL-PR) – A favor
Pedro Lupion (PP-PR) – A favor
Ricardo Barros (PP-PR) – A favor
Rossoni (PSDB-PR) – A favor
Rubens Bueno (Cidadania-PR) – Contra
Sandro Alex (PSD-PR) – A favor
Sargento Fahur (PSD-PR) – A favor
Sergio Souza (MDB-PR) – A favor
Toninho Wandscheer (PROS-PR) – A favor
Vermelho (PL-PR) – A favor
Zeca Dirceu (PT-PR) – Contra
Fonte: APUFPR