Docente da Udesc é processada em ação na Justiça de Santa Catarina

Autora da ação, uma ex-aluna, se intitula “antifeminista e cristã” e defende a Escola sem Partido

Em meados de 2016, Marlene de Fáveri, professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), se tornou ré de uma ação na Justiça de Santa Catarina por sua ex-aluna do Programa de Pós-Graduação em História (PPGH), Ana Caroline Campagnolo. A demanda foi ajuizada na Comarca de Chapecó (SC) no dia 13 de junho do ano passado.

A ex-aluna e atual professora de história em escolas de Chapecó, no oeste de Santa Catarina, alegou no processo que foi discriminada por ser antifeminista e cristã e exigiu uma indenização de R$ 17 mil de sua ex-orientadora. Ana Caroline é conhecida por propagar opiniões em suas redes sociais de cunho conservador, machista e LGBTfóbico. Também defende publicamente o programa “Escola sem Partido”.

Em nota, a Associação dos Professores da Udesc (Aprudesc – Seção Sindical do ANDES-SN) manifestou seu apoio à professora e afirmou que disponibilizou, de imediato, a sua assessoria jurídica para atuar no âmbito do processo judicial. “Este caso, que não é, infelizmente, o único, é emblemático pelo processo de doutrinação conduzido pelo Movimento Escola Sem Partido, cujas consequências têm sido danosas aos professores e professoras, a estudantes e à sociedade de uma forma geral, particularmente entre os que não compartilham de visões hegemônicas trazidas em processos de ensino-aprendizagem. Defendemos a liberdade de expressão de nossas/os associadas/os e das/os trabalhadoras/os em geral, motivo pelo qual desde 2016 a APRUDESC tem atuado nas lutas contra a Lei da Mordaça e contra o Movimento intitulado ‘Escola Sem Partido’, que vem buscando se impor na sociedade brasileira nos últimos anos”, criticou.

Ainda em nota, a seção sindical do ANDES-SN afirmou que a Constituição Federal do Brasil, de 1988, prevê em seu artigo 206 que o ensino deve levar em conta a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber e o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas. Já no artigo 207 diz ainda que “as universidades gozam de autonomia didático-científica”.  O Estatuto da Udesc também expressa similar entendimento ao afirmar que “A UDESC, como Universidade pública e de ensino gratuito em busca de excelência, é aberta às diferentes correntes de pensamento e orienta-se pelos princípios de liberdade de expressão, democracia, moralidade, ética, transparência, respeito à dignidade da pessoa e seus direitos fundamentais”.

Marlene de Fáveri é professora efetiva da Udesc e desempenha atividades de ensino, extensão, pesquisa e administração há muitos anos. A docente é reconhecida tanto por seus trabalhos sobre as comunidades imigrantes de Santa Catarina durante a Segunda Guerra Mundial quanto em sua atuação em pesquisas sobre Relações de Gênero. O trabalho de Marlene conta com o reconhecimento de diferentes instituições científicas, entre as quais a Associação Nacional de Professores Universitários de História (Anpuh) e o Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina (IHGSC). Este último conferiu o Prêmio Lucas Alexandre Boiteux – História, em 2005, pelo seu livro Memórias de (uma) outra guerra: cotidiano e medo durante a Segunda Guerra em Santa Catarina.

Apoio

Diversas entidades se solidarizaram, por meio de nota pública, com a professora Marlene de Fáveri. Além da Aprudesc – Seção Sindical do ANDES-SN, o Conselho de Centro do Centro de Ciências Humanas e da Educação (FAED), da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) manifestou na terça-feira (4) apoio e solidariedade à professora Marlene de Fáveri e garantiu que a professora “sempre desempenhou suas funções de forma ética e responsável e contribuiu para construir a respeitabilidade da nossa Universidade em nível nacional e também internacional”.

O grupo de estudos de Gênero da universidade também expressou indignação diante do caso e afirmou na nota que a professora em questão é reconhecida na instituição pela excelência de seu trabalho de pesquisa e pela seriedade com que se dedica à docência. “Declaramos nossa total solidariedade à professora e demais colegas que estejam vivendo situação semelhante. Dizemos não à Escola da Mordaça por defendermos uma escola crítica e democrática, em que o conhecimento se produza por meio do debate e da liberdade de expressão”. Além do Departamento de História da Udesc e o Programa de Pós-Graduação em História (PPGH) da mesma instituição, que demonstraram apoio a docente.

No final de março, a Associação Nacional de Professores Universitários de História (Anpuh) se manifestou com relação ao caso da docente em Santa Catarina, como também em outros dois casos de coação e perseguição sofridos por professores de História nos últimos meses. Para a associação, os ataques são estimulados pelo movimento “Escola Sem Partido”, que organiza eventos, produz conteúdo digital divulgado em seu sítio eletrônico e patrocina ações legislativas, por inferir que professores estariam fazendo “doutrinação esquerdista” dos seus alunos.

Além do caso da professora Marléne de Faveri, acusada de suposta propaganda do feminismo em sua atividade docente, a Anpuh citou o episódio do Colégio Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro. Lá, professores de História foram interpelados pelo Ministério Público Federal, que acaba de abrir um processo administrativo contra esses servidores públicos por supostos delitos. E também o caso de José Mineiro, professor da rede pública estadual do Rio Grande do Sul, que foi afastado do seu cargo em função do conteúdo de sua atividade docente.

A Aprudesc-SSind. ainda reitera que o exercício pleno da autonomia didático-científica nas universidades deve ser preservado como condição fundamental no processo de construção do conhecimento. “Salientamos que a professora Marlene de Fáveri, assim como qualquer outra pessoa da comunidade acadêmica, não pode sofrer punições por declarar e defender suas posições político-pedagógicas, fundamentadas nos consensos científicos e na ética profissional. A mordaça afronta o livre pensar em uma instituição cujo fim é exatamente promover a liberdade de pensamento. Quem cala uma professora, mata a educação! Por isso, não nos calaremos!”, diz a nota.

Com informações de Aprudesc-SSind e Uol

Fonte: ANDES-SN


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