Desmonte da ciência e da pesquisa no Brasil

aAs universidades públicas brasileiras, o Sistema Nacional de Pós-graduação em nível de mestrado e doutorado, estão diante do maior ataque da sua história pelo Governo Temer, que aplicando o congelamento de investimentos por 20 anos, pode deixar milhares de professores e estudantes no Brasil e no exterior sem bolsas de estudos, desmontando assim a pesquisa básica e aplicada e destruindo a ciência brasileira.

O sistema atual de pós-graduação deu um salto extraordinário em meados da década de 1980, no Governo Sarney. Em 1987 eclodiu a maior greve nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), que durou 45 dias. Como resultado desse conflito os professores conquistaram o atual Plano de Carreira Docente baseado no mérito acadêmico, que exigia para ingressar na carreira como professor assistente o título de mestre e para professor adjunto o título de doutor. Conseguiram a isonomia jurídica com o fim das Fundações, transformando todas em autarquias, acabando assim com o regime celetista. Para viabilizar o plano de carreira docente era necessário obter a titulação e raras universidades públicas fora do eixo Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e o Rio Grande do Sul, tinham cursos de pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado). Tal situação inviabilizaria as conquistas do movimento docente naquela greve.

A estratégia do movimento docente liderado pelo ANDES/SN, que comandou todas as greves desde o início dos anos de 1980, em defesa da universidade pública, foi articular uma ação nacional estimulando os docentes a criarem cursos de pós-graduação stricto sensu nas IFES, jogando para a CAPES a aprovação e financiamento dos cursos. A estratégia teve êxito total, em pouco tempo as IFES expandiram e continuam expandindo os cursos de mestrado, doutorado e pós-doutorado.

Para se ter uma ideia da situação na época, a UFPR só tinha sete cursos de pós-graduação  stricto sensu, na Bioquímica, História,  Solos, Engenharia Florestal e Letras, Genética,  Zoologia, hoje tem 87 programas.

Nessa época sucedendo o Reitor Riad Salamuni, estava o Reitor Prof. Carlos Alberto Faraco, ambos eleitos diretamente pela comunidade acadêmica. O Prof. Faraco atuou na expansão do pós-graduação, diante da dura realidade dos professores da UFPR, cuja maioria absoluta não tinha titulação. Os professores eram obrigados a cursarem pós-graduação no exterior, em SP, RS e RJ, viajando de ônibus. Era um quadro muito difícil pois a Capes oferecia poucas bolsas, a universidade não podia dispensar das atividades acadêmicas por não ter recursos para contratar professores substitutos. Os professores que saíam para a pós-graduação gastavam do seu salário e tinham que arcar com toda a carga didática, que era pesada.

A realidade da UFPR foi mudando rapidamente. Em 1987, quando eu era Chefe do Departamento de Economia, com o apoio do Prof. Faraco conseguimos aprovar o primeiro Curso de Mestrado em Desenvolvimento Econômico, no Setor de Ciências Sociais Aplicadas, sendo acompanhado depois pelo Curso de Administração e Ciências Contábeis. Para montar tais cursos, foi necessário buscar professores em vários cursos da universidade, pois tínhamos muito poucos doutores. Assim fez a maioria das universidades brasileiras, jogando sobre a CAPES a responsabilidade de aprova-los para que a Carreira Docente fosse implantada, fazendo assim avançar a pesquisa e a produção científica.

Foi nessa luta que o Brasil se tornou o 2º Sistema de Pós-graduação implantado fora do 1º. Mundo, tendo a Índia conquistado o 1º. Lugar.

Foi assim que o Brasil se projetou internacionalmente na ciência e na pesquisa nas várias áreas, obtendo autonomia no setor energético, energia elétrica e petróleo, telecomunicações, na energia nuclear com a centrifugação do urânio, na aviação comercial com a Embraer, na agricultura com a Embrapa e pesquisas na área agronômica das IFES, na área da construção pesada com grandes obras de estradas, pontes e hidroelétricas, saúde com a produção de remédios, rompendo com o monopólio da indústria farmacêutica mundial, deu um salto espetacular na cura das doenças tropicais, na cura do câncer e tantas outras doenças.

Engana-se quem imagina que as medidas do Governo Temer de congelamento dos investimentos públicos são por falta de recursos, pois esses sobram para dar benefícios fiscais à indústria e ao agronegócio, para a exportação de produtos agrícolas, para o pagamento de juros aos bancos que consomem 47% do orçamento nacional. O que está por trás de tais cortes é o desmonte da ciência e da pesquisa nas IFES, responsáveis por 95% da produção científica no país, da indústria nacional e das estatais.

Embraer já foi comprada pela Boeing, as petroleiras já compraram o petróleo do pré-sal, a maior empresa brasileira de energia elétrica foi para leilão, a Embratel já foi, o capital estrangeiro já está adquirindo as empresas educacionais no país e assim estão leiloando o Brasil, só faltando o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal e a Petrobrás, que, com a desvalorização que sofreu com a operação lava-jato, está pronta para ser leiloada a baixo preço.

Estamos diante de um projeto internacional cujo objetivo final é a recolonização do Brasil. Sem ciência e produção tecnológica autônoma, o que nos impõe o capital internacional é sermos mero mercado consumidor das suas mercadorias e dos seus pacotes tecnológicos.

Por tudo isso, a atual mobilização das universidades públicas brasileiras contra essa sanha de desmonte é denunciar, resistir para garantir tudo que construímos em termos de ciência e tecnologia, para garantir a autonomia do país, para que nossas crianças e jovens tenham uma pátria para se orgulhar.

Nosso reconhecimento aos professores aposentados e da ativa, aos técnicos- administrativos, aos estudantes por continuarem essa luta em defesa da universidade pública.

* Professor aposentado da UFPR, doutor em Desenvolvimento Econômico pela UFPR, ex-presidente da APUFPR, ex-diretor do ANDES/SN, Conselheiro Titular do Conselho da Cidade de Curitiba. E-mail: <[email protected]>


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