Conselho de Economia promete investida contra desigualdade social

Juro alto dá lucro aos ricos, enquanto nova lei trabalhista tira renda dos pobres, segundo novo presidente da entidade

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Um economista deve levar em conta a vida das pessoas na hora de bolar propostas e análises? Ou olhar apenas para números e deixar que os efeitos sociais de suas ideias sejam resolvidos pelos políticos? O novo presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon) pertence ao primeiro time e acaba de assumir disposto a mergulhar na eleição.
Foi com essa postura que Wellington Leonardo da Silva elegeu-se para o cargo em dezembro em uma categoria que, segundo ele, tem muita gente conservadora. “Para mim, economia é uma ciência humana”, diz.
Na sucessão de Michel Temer, campanha que começa em agosto, ele acredita que o mais importante será discutir desigualdade, o batalhão de pobres num país de poucos ricos. O tema marcou seu discurso de posse em janeiro, cerimônia que contou com a presença da recém assassinada vereadora Marielle Franco (PSOL). “A desigualdade precisa ser politizada”, afirma.
E qual seria a relação entre a praia dele, a economia, e desigualdade?
O Brasil tem uma das mais altas taxas de juros do planeta, mesmo que a chamada Selic esteja no patamar mais baixo já fixado pelo Banco Central (BC). Isso garante lucros gordos aos rentistas e especuladores em geral.
O mesmo governo que mantém a Selic elevada patrocinou uma reforma trabalhista destinada a baratear o brasileiro. Aqui e ali, surgem vagas com salário de 4,30 reais por hora.
Juros altos com os quais os endinheirados ganham mais dinheiro ao aplicar no sistema financeiro, reforma trabalhista que reduz a renda dos mais pobres, tudo fruto de uma única política econômica.
“A economia está estagnada, o crescimento não vai chegar a 2% este ano”, diz Leonardo, a contrariar o “mercado”, que aposta em algo entre 2,5% e 3%.
No Rio de Janeiro, onde mora e trabalha, Leonardo surpreende-se com o aumento de camelôs e pessoas dormindo na rua. “Tem muita gente que mora longe do centro, como porteiros, e dorme na rua durante a semana, só volta para a casa na sexta, para economizar o dinheiro da passagem de ônibus”, diz ele, um descrente quanto ao sucesso da intervenção federal na segurança do estado.
“Você acha que um jovem prefere ser office boy ganhando 954 reais por mês ou ser traficante ganhando 1,5 mil reais por semana?”, pergunta ele.
É o tráfico também, diz, que torna determinados itens de consumo acessíveis a uma parte da população. De que jeito? “O roubo de cargas aumentou muito no Rio depois das UPPs. Os traficantes foram expulsos dos morros mais conhecidos para outros mais distantes, onde o consumo de cocaína é baixo, coca custa caro. Eles passaram roubar carga nas estradas. Uma geladeira de 1,9 mil reais chega ao dobro do preço, graças ao juro do crediário, e o tráfico tem vendido por 350 reais”, conta ele, informado a respeito da vida nos morros por uma funcionária moradora da Rocinha.
Para ele, a estagnação econômica vai piorar no Brasil inteiro, devido à reforma trabalhista e seu potencial de reduzir a renda. “O Brasil vive um problema econômico clássico: não há consumo, por isso as empresas não investem, preferem deixar o dinheiro no sistema financeiro. Nossas empresas viraram bancos.”
“Sem mercado interno, o Brasil não tem como crescer. O mundo não quer mais dos nossos produtos, quer menos, como demonstra a decisão do governo Donald Trump de aumentar a taxação do aço”, reforça o presidente do Cofecon – na quinta-feira, o governo americano recuou parcialmente e incluiu o Brasil em uma lista de países isentos das novas tarifas sobre aço e alumínio, ao menos temporariamente.
Para contornar o problema clássico, a única saída, na opinião de Leonardo, seria o investimento estatal. “O déficit público não deve ser um impedimento para o investimento público numa crise. Se o Estado não investe, não será o setor privado que vai, pois não há perspectiva de lucro.”
A política econômica do governo Temer vai na direção oposta, baseada na crença de que o setor privado será capaz de puxar o crescimento, confiante em medidas como o controle dos gastos públicos.
Uma das primeiras iniciativas do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi propor o congelamento das despesas públicas por 20 anos, aprovada no Congresso em 2016. “Agora imagine: se a saúde já está ruim, ela vai piorar. Se a educação está ruim, vai piorar. Se a segurança está ruim, vai piorar”, diz Leonardo.
Os EUA e alguns países europeus enfrentaram a crise financeira global de 2008 com redução drásticas de juros e injeção de dinheiro na economia real, ainda que parte dessa injeção tenha sido capturada pelo sistema financeiro. “Por que não podemos fazer isso agora?”, pergunta Leonardo.
O País seguiu a receita em 2008, mas com um erro político do governo Lula, na avaliação do presidente do Cofecon. “O Lula chamou a crise de marolinha e ela não foi uma marolinha. Isso permitiu aos economistas conservadores dizerem que aquela política econômica quebrou o Brasil.”
Fonte: Carta Capital


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